quinta-feira, 31 de março de 2011

Verdades (inconvenientes) sobre um incêndio

"Vamos celebrar A estupidez do povo Nossa polícia e televisão Vamos celebrar nosso governo Nosso estado que não é nação..." (Renato Russo) 
Ao contrário do que li na maior parte da imprensa, queria dar o meu testemunho de quem viu, pessoalmente, o incêndio na Praia Vermelha. Muitas pessoas têm me perguntado sobre o assunto e achei melhor fazer um esclarecimento sobre o que, de fato, aconteceu. A saber:



. Os bombeiros demoraram muito para chegar e agir no combate às chamas. Toda essa demora facilitou que o fogo se alastrasse. No início, o fogo estava apenas na capela, mas se espalhou pelos três andares da Faculdade de Educação.

 . Os alunos não foram orientados a deixar o prédio do Palácio Universitário logo que o incêndio começou. As aulas transcorriam normalmente. A maior parte das pessoas saiu apenas no intervalo, por vontade própria, para ver o que estava acontecendo.

. Não isolaram adequadamente a área, como deveria ser feito. Os alunos e funcionários estavam próximos do Palácio, de tal forma que, se o fogo se alastrasse, poderia provocar maiores acidentes.

. Até umas 15 horas, só havia uma viatura do Corpo de Bombeiros e uma da Polícia. Essa, por sua vez, portava armas de grande porte em meio a uma multidão de alunos. Algo extremamente perigoso.

. Lamentável saber que alunos de faculdade particulares acharam graça do ocorrido e ficaram fazendo "piadinhas". Um incêndio como esses pode ocorrer em qualquer lugar. Não estamos imunes a isso.



Houve uma certa alienação de parte da sociedade que, mesmo sabendo do ocorrido, não deu a devida atenção ao fato. Isso pode ser comprovado pelo pequeno destaque dado ao episódio na imprensa. Nesses pequenos detalhes, percebemos o descaso com a educação e o patrimônio histórico do país. O Palácio Universitário é tombado e sempre apresentou dificuldades burocráticas para suas reformas.

. A Faculdade de Educação estava sendo reformada. No entanto, além dela, outras partes do Palácio também precisam de reformas, como é o caso da Escola de Comunicação.

Por fim, agradeço aos alunos e amigos que, por meio das redes sociais, também ajudaram na divulgação do que estava acontecendo no dia. Cabe a nós, futuros profissionais da Comunicação, estabelecermos esse compromisso com a verdade dos fatos.

  

segunda-feira, 28 de março de 2011

A tristeza de Minerva

Minerva é a deusa da sabedoria. É também o símbolo da UFRJ. Está por todos os lados nos campi. Na Praia Vermelha, particularmente, há uma estátua em sua homenagem.



No entanto, hoje Minerva não está feliz. Não cultiva mais o seu sereno ar de sabedoria. Minerva estava no meio do incêndio que atingiu o Palácio Universitário, principalmente a Faculdade de Educação. Minerva viu os alunos saírem de suas salas. Viu o prédio ser evacuado. Viu a aglomeração de pessoas que se formou próximo ao local. Ouviu as explosões. Ouviu o barulho dos vidros das janelas se quebrando.

Um prédio com mais de 100 anos. Um prédio histórico. Minerva viu gerações crescendo ali, grandes talentos surgindo. Minerva viu também parte da história da minha família ser construída. Minha avó foi professora da Faculdade de Educação. Minha mãe e meu pai se conheceram e se casaram lá. Eu estudo naquele prédio. Minerva viu, certamente, outras histórias assim.



Nesse momento, provavelmente, Minerva não está mais lá. Se estiver, estará chocada e emocionada, como todo nós. Anos de história. Um palácio belíssimo e encantador. Uma tradição.

Hoje, todos os alunos e funcionários da UFRJ vão dormir mais tristes. Minerva não deve estar mais nos observando. Mas a solidariedade não será consumida por chamas. Não esqueceremos a história daquele lugar. Vamos reconstruir o que for necessário.

Minerva agradecerá.

Força UFRJ!

quinta-feira, 24 de março de 2011

Além das sombras

"O pior cego é aquele que não quer ver"

Em uma de suas mais famosas obras, Platão conta uma história sobre pessoas que passaram toda sua vida dentro de uma caverna, isoladas, sem conhecer outra realidade que não aquela. A única visão que tinham era das sombras projetadas no fundo de uma parede. Eis que, um dia, um desses homens da caverna resolve questionar sua existência e o porquê de estar naquele lugar. Com certa dificuldade, consegue se desvencilhar das correntes que o prendiam e vai ao encontro do mundo lá fora, a realidade. De início, a claridade incomoda os seus olhos e ele nada vê. Pouco a pouco, porém vai se acostumando e passa a enxergar. Vê um mundo diferente, muito além de meras sombras. Fica fascinado com o que vê e retorna à caverna para falar aos companheiros. Ao contar aos demais a beleza do mundo lá fora, seus amigos não acreditam.




Apesar de ser apenas uma obra ficcional, a alegoria poderia se ajustar ao mundo atual. Quantas vezes encontramos pessoas que não querem encarar a realidade, vê-la com seus próprios olhos? Muitas preferem ficar fechadas em seu mundo, sem se libertar das "amarras" e das "correntes". E, quando são confrontadas por outros sobre a verdade, não querem admiti-la. Querem continuar a viver da mesma forma, sem "enxergar".

Infelizmente, em nossa sociedade, temos muitos "prisioneiros da caverna". São pessoas teimosas que só veem um lado da coisa: o seu. E, quando têm a oportunidade de conhecer novos ares, novas opiniões, não a fazem. Preferem morrer com o que acreditam, com suas ideologias. Acabam não compreendendo a importância da diversidade, de ver todos os lados de uma questão.



Os "prisioneiros da caverna" estão por toda a parte: nas ruas, nas escolas, no trabalho. Muitos desses são antiquados, parados no tempo. Atacam os de opinião contrária ferozmente, porque não sabem lidar com isso. Por exemplo, nem sempre se pode escrever ou mesmo falar o que se pensa. Apesar de termos liberdade de expressão, basta uma opinião diferente sobre algum assunto polêmico para sermos bombardeados pelas críticas.

Fica, então, um apelo para os "prisioneiros da  caverna": libertem-se das correntes e passem a enxergar, verdadeiramente, o mundo.

quinta-feira, 17 de março de 2011

Descendo a ladeira...


"Educação nunca foi despesa. Sempre foi investimento com retorno garantido." (Arthur Lewis)
No final do ano passado, foi divulgada uma nova pesquisa do Programa de Avaliação Internacional de Estudantes (Pisa). Mais uma vez, o Brasil ocupava as últimas posições no ranking. Em uma avaliação internacional que mede o nível de conhecimento de estudantes de 15 anos, o país ficou em 54° em um total de 65 países. O Brasil conseguiu ficar atrás de países como Trinidad e Tobago e Tailândia.



Muitas pessoas não dão a devida atenção a esses números. Talvez pelo recente crescimento do PIB, talvez por desconhecimento.Ocupar as últimas posições em avaliações de educação já virou uma constante no país. Mudam-se as provas, os institutos. Contudo, o resultado é o mesmo, o que comprova a má qualidade do setor.

A verdade é que a educação no Brasil está sucateada desde sua base. Não há infraestrutura adequada nas escolas. São poucos e insuficientes os programas de formação e valorização dos professores, fatores esses de fundamental importância para um país que deseja estar ao lado das grandes potências. Um bom ensino é a fonte de conhecimento e deve servir como ponto de partida para o crescimento econômico.



No Brasil, por exemplo,  percebe-se que poucos são os alunos interessados no magistério, diferentemente do que ocorria antigamente. E esses poucos interessados são, muitas vezes, os que tiram notas mais baixas. Os bons alunos optam por outras áreas, como Medicina e Engenharia, profissões mais valorizadas no mercado.

São poucas também as políticas que incentivam a valorização e qualificação dos profissionais. Não há estímulos para pesquisa, participação em cursos, etc. Assim, de nada adianta ter um professor parado no tempo e que não produz e nem transmite seu conhecimento.

Desta forma, é necessário investir maciçamente na educação. Só com um bom ensino e sem "politicagem", o Brasil poderá almejar algo a mais. Caso contrário, ficará mais uma vez nas últimas posições dos rankings. E assim, várias oportunidades e talentos serão, mais uma vez, desperdiçados.

quinta-feira, 10 de março de 2011

Uma cidade chamada Brevidade

"Cada lágrima ensina-nos uma verdade" (Ugo Foscolo)
Brevidade era uma pequena cidade localizada bem no interior do país. Era tão minúscula que não constava na maioria dos mapas da região. Mas, para os habitantes, isso era irrelevante: a verdade é que todos tinham Brevidade no coração.

A cidade vivia basicamente da agricultura familiar e do artesanato local. Mas o grande símbolo, motivo de orgulho dos moradores, era mesmo a praça principal. Não que a praça fosse uma grande obra arquitetônica ou tivesse imensos jardins. No entanto, era um local agradável, bucólico, que servia como ponto de encontro dos locais, que passavam horas sentados em seus bancos, jogando conversa fora.

Na praça principal havia uma igreja, que ficava sempre cheia - principalmente aos domingos - um parquinho onde as crianças se divertiam e uma fonte. Por sinal, essa última é o principal elemento dessa história.

Já pela manhã, várias pessoas se reuniam ao redor da fonte. O senhor idoso, já de cadeira de rodas, que vinha junto de sua acompanhante aproveitar o sol; as babás que traziam as crianças para se divertir e um outro casal apaixonado que passava a noite ali.


A fonte era, de fato, muito bonita. Toda detalhada, sempre estava jorrando água. Quando o vento batia alguns desavisados até eram atingidos por suas gotas. Não havia quem não ficasse encantado com o lugar.

À noite, depois da missa, a população também se reunia na praça ao redor da fonte. Comentavam sobre a missa, sobre o dia de cada um, fofocavam...Era um verdadeiro ponto de encontro.

Contudo, numa certa madrugada o sol não nasceu como de costume. Uma névoa estranha cobria a cidade. Conforme as horas iam passando, a cidade continuava vazia. Seu José foi um dos que saíram de casa. Logo percebeu o porquê daquele silêncio.  As casas estavam quase todas destruídas. Vários moradores sobre os escombros. Uma poeira insuportável pairava no ar e irritava os olhos. Seu José, carpinteiro da região, ficou impressionado com o que via. Foi andando até a praça principal e ficou ainda mais arrasado: a igreja já não estava mais de pé, nem o parquinho. Só restava mesmo aquela velha fonte. Mas ela não jorrava mais água.



A cidade teve que ser toda reconstruída. Os poucos moradores restantes arrecadaram dinheiro para ajudar. Aos poucos, bem lentamente, a população tentava retomar suas vidas. A praça foi refeita, uma nova igreja e casas foram construídas. No entanto, algo de curioso intrigava os moradores. A fonte nunca mais tinha jorrado água e estava toda suja. Por mais que tentassem revitalizá-la, ela parecia insistir: nada de água.

Muitos anos se passaram assim, sem uma  única gota na fonte. As pessoas já não se reuniam ao seu redor e tinham perdido as esperanças. Até que um dia,  na "reinauguração oficial" da cidade,  festa promovida pela prefeitura, ela voltou. Aos pouquinhos, podiam-se ver pequenas gotas de água saindo. Quase imperceptíveis, mas saíam. A população, ao saber do ocorrido, logo se dirigiu ao local. E por um momento, José - que tanto ajudara na reconstrução da cidade- teve certeza que não era uma água qualquer. A fonte parecia soluçar e chorar pelo desastre que ocorrera na cidade.  Parecia ter adormecido de seu luto pelo senhor de cadeira de rodas, o casal de namorados, as babás com as crianças... As gotas d'água da fonte eram, na verdade, lágrimas.

quinta-feira, 3 de março de 2011

Por fazer...

 "O que fazemos durante as horas de trabalho determina o que temos; o que fazemos nas horas de lazer determina o que somos." (Charles Schulz)

20:50- Ela olha o relógio pela quinta vez nos últimos vinte minutos. "O tempo não passa", pensa ela. A essa hora, a maior parte das pessoas já foi para casa. No escritório, só restam ela e alguns funcionários da limpeza.

A pilha de papéis sobre sua mesa continua enorme. Apesar de fazer hora extra, o trabalho parece não dar resultado. A todo instante surgem mais contratos a serem analisados. Ela já não aguenta mais. Sente uma dor de cabeça irritante. Levanta de sua cadeira e pega o "remedinho milagroso" para todas as situações.

"Ah, quer saber? Vou aproveitar e arrumar a sala." Tenta organizar as pastas, os blocos e as canetas. Naturalmente, não consegue. Mas deixa assim mesmo, por fazer...

21:00- Tranca sua sala e bate o ponto. "Mais um dia de hora extra que chega ao fim. Agora é ir para casa e relaxar.


Enquanto espera o manobrista pegar seu carro, confere o celular. Várias chamadas não atendidas. Três delas de sua filha. "Ai, meu deus, como pude esquecer..." Tinha prometido à filha que ligaria e tentaria chegar cedo em casa. Esqueceu de avisá-la que tinha hora extra, que não seria possível.

O carro finalmente chega. Entra rapidamente. Na pressa, arranca com o veículo e quase não vê o senhor que estava à frente.

Logo ao virar a esquina, vê o que temia: tudo engarrafado. "Não, hoje não, por favor. Já estou cansada", suplica, como se adiantasse algo. Com o trânsito todo parado, resolve ligar para a filha. A chamada não completa. Tenta várias vezes. Nada. Ouve então as notícias do rádio para descontrair e ver se a dor de cabeça passa.

22: 32- Finalmente, chega em casa. Abre a porta. Tudo escuro. Larga as coisas na sala e vai até o quarto da filha. Entra delicadamente. Mas a menina já está dormindo. A babá vem ao encontro e avisa que a criança foi para cama mais tarde hoje, esperando pela chegada da mãe. Mas não aguentou o cansaço e acabou dormindo.



A mãe senta então na poltrona da casa e tira os sapatos para aliviar a tensão.  Percebe que está chorando. "Que péssima mãe eu sou. Não vi minha filha o dia inteiro, nem consegui ligar..." Percebe que não tem acompanhado como gostaria o crescimento da menina. Desde que se separou, as coisas ficaram mais difíceis. Tem que trabalhar mais para sustentar as duas e as horas de lazer entre elas são cada vez mais raras.

 De repente, sente que seu ombro está molhado. Sim, as lágrimas aumentaram...