quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Nas entrelinhas 2

No post de hoje, daremos continuidade a uma seção aqui inaugurada cujo objetivo é compreender as letras das canções brasileiras. Após uma primeira experiência bem-sucedida com a canção "Daniel na cova dos leões" (Legião Urbana), agora é a vez d'Os Paralamas do Sucesso, com "Luís Inácio (300 picaretas)".

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Luís Inácio (300 picaretas)


Luís Inácio falou, Luís Inácio avisou
São trezentos picaretas com anel de doutor
Luís Inácio falou, Luís Inácio avisou
Luís Inácio falou, Luís Inácio avisou
São trezentos picaretas com anel de doutor
Luís Inácio falou, Luís Inácio avisou

Eles ficaram ofendidos com a afirmação
Que reflete na verdade o sentimento da nação
É lobby, é conchavo, é propina e jeton
Variações do mesmo tema sem sair do tom
Brasília é uma ilha, eu falo porque eu sei
Uma cidade que fabrica sua própria lei
Aonde se vive mais ou menos como na Disneylândia
Se essa palhaçada fosse na Cinelândia
Ia juntar muita gente pra pegar na saída
Pra fazer justiça uma vez na vida
Eu me vali deste discurso panfletário
Mas a minha burrice faz aniversário
Ao permitir que num país como o Brasil
Ainda se obrigue a votar por qualquer trocado
Por um par se sapatos, um saco de farinha
A nossa imensa massa de iletrados
Parabéns, coronéis, vocês venceram outra vez
O congresso continua a serviço de vocês
Papai, quando eu crescer, eu quero ser anão
Pra roubar, renunciar, voltar na próxima eleição
Se eu fosse dizer nomes, a canção era pequena
João Alves, Genebaldo, Humberto Lucena
De exemplo em exemplo aprendemos a lição
Ladrão que ajuda ladrão ainda recebe concessão
De rádio FM e de televisão
Rádio FM e televisão


Essa canção foi composta por Hebert Vianna, vocalista d'Os Paralamas do Sucesso, no ano de 1993 e lançada posteriormente, em 1995, no CD "Vamo Batê Lata".

O mote da música foi uma declaração de Luís Inácio Lula da Silva, depois presidente da República, na qual afirmava que "há no Congresso uma minoria que se preocupa e trabalha pelo país, mas há uma maioria de uns 300 picaretas que defendem apenas seus próprios interesses".




Como não podia deixar de ser, tal declaração teve grande repercussão na mídia. A execução pública da canção chegou a ser proibida por um procurador da Câmara e muitos parlamentares apoiaram a ideia. No final, a música acabou sendo proibida nas rádios e nas lojas.

A canção faz menção a alguns esquemas de corrupção ("é lobby, é conchavo, é propina e jeton"), como por exemplo, os "Anões do orçamento", escândalo de fraudes nos recursos da União ("Papai, quando eu crescer eu quero ser anão Pra  roubar, renunciar, voltar na próxima eleição"). Cita nominalmente ainda dois deputados envolvidos nesse esquema (João Alves de Almeida e Genebaldo Correia) e o ex-senador da Paraíba, Humberto Lucena.

Posteriormente, no ano de 2005, a música foi uma das mais lembradas para descrever a crise política instalada com o Mensalão, mesmo após mais de 10 anos de ser lançada.



Saindo um pouco da análise da letra propriamente dita, a canção pode nos levar a importantes observações. Primeiramente, podemos perceber que os escândalos políticos não são novidades e já existiam em 1995 quando a música foi lançada. Outro tópico relevante é a questão da liberdade de expressão. Por que a música foi censurada? Tal medida é constitucional?

Por fim, percebo que há uma escassez atual de músicas que falem sobre as questões político-sociais. Será uma mera coincidência ou um reflexo de que a sociedade não se interessa pelo assunto?

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